quinta-feira, 10 de julho de 2014

Músico - por Nelson Junior

Músico

Como músico comecei aos 13 anos de idade estudando 2 horas por dia, depois 4 horas por dia, depois 6 horas por dia, chegando ao máximo de 8 horas por dia até os 19 anos quando começou a contagem regressiva...Vou explicar...

O músico que vive realmente de música em primeiro lugar abdica de vida social, em prol do estudo e enquanto os amiguinhos de escola jogam bola, vão a piscina, vão ao cinema, ele toca, porque em horas vagas ele ensina, e foi assim que fiz...Estudo minha vida para ensinar minha Eternidade

Foram vindo mais e mais alunos, e cada dia mais passei a ter menos tempo para os meus estudos e sonhos...

O trabalho com projetos autorais, com gravações e acompanhando pessoas vai tomando proporções e ou você dorme, ou você estuda, e por vezes seu corpo o força a dormir, e então você trabalha mentalmente nos projetos, criando arranjos e tendo ideias.

Aí você começa a ver  que seu trabalho não é valorizado, e para muitos isso coincide com despesas pessoais, encargos, doenças e problemas familiares, uniões, separações, pensões, educação dos filhos, escassez de trabalho em períodos do ano onde o “lepo lepo” manda, e por aí vai, mas você cria coragem todos os dias se olha no espelho e diz, “vale a Pena”, e assim procede até  o teste da saúde familiar ou pessoal, e se desse você sai convicto, você continua.

Você observa incrédulo, colegas saírem posando de bem sucedidos com problemas iguais aos seus, e esconderem para parecerem “Rock Stars” e observa orgulhoso alguns que são bem sucedidos agirem com humildade, mesmo que poucos...

Você prossegue, e vê muito preconceito, mas luta contra ele, e vê seus familiares e amigos acharem que você não trabalha se você acorda tarde, mas ninguem esta ao seu lado quando você termina de trabalhar às 6 da manhã e ainda nem recolheu os cabos, ou fechou os softwares de gravação, ou terminou aquele arranjo, e nem terminou de tirar as 45 novas músicas para o show de sábado.

Aí você se pega com tantos afazeres que esquece de estudar, esquece de comer, esquece de dormir, e quando come é o que for mais prático, quando dorme é porque desmaiou no sofá ou na cadeira do computador e quando estuda é porque percebe que a frase que você gravou no álbum do seu contratante e que você criou fica mais difícil pra você mesmo executar...E aí  você se cobra mais do que qualquer pessoa.

Aí, você percebe que tem caras que tocam por cerveja, ou para impressionar as mulheres e amigos, ou para ter uma ocupação de fim de semana para não visitar a sogra, e que por vezes tocam com mais publico, dão lucro ao bar, mas não querem ganhar dinheiro, ou caras irresponsáveis se perderem nas drogas por prazer ou por não terem estrutura para lidar com todos os outros problemas citados anteriores.

É uma “carreirinha”, um “tapinha”, um “pico” e ai o bom nome da classe vai pro saco, e não para o saco de cheirar cola, mas para o lixo dos mal vistos...E a gente prossegue apesar disto tudo, passando a vergonha alheia de quem opta por ser eternamente adolescente no sentido de falsa rebeldia, porque decide viver um ano a mil do que mil anos a 10, sendo que como o corpo só é produtivo no 10, faz tudo atravessado, vivendo drogado ou sem responsabilidade, mas a gente continua...

Aí a gente enfrenta milhares de pessoas  que pagam para ver qualquer um com o nome de “John”, mas quando marcamos um evento, nos perguntam “é na faixa”, e quando tentamos pedir crowdfunding para um trabalho “mendigo” somos nós...Mas a gente continua...

Um ano viram 5 que viram 10 e que viram 30 e você ainda se lembra perfeitamente que queria ouvir sua música no rádio, mas nota que agora só o youtube importa, e nele, qualquer um toca, qualquer um fala, e qualquer coisa vale, mesmo que não tenha pé, cabeça ou sentido...e com muita dificuldade a gente continua...

As ofensas na internet ficam maiores, o calotes inomináveis as tristezas gigantescas, mas a gente continua...

Você vê pessoas que te puxam o tapete ou puxaram o tapete pedirem mais e mais de seu tempo, e mesmo sabendo que lida com víboras, opta por ser cordeiro, e invariavelmente acaba picado, mas a gente continua...

Temos ofertas de migrar de profissão,  ou de nos acomodar em coisas que são secundárias, mas todos precisam e cobram de nós o que fazemos melhor e então a gente continua...

Vemos nossos filhos crescerem e quando eles tocam temos uma mistura de orgulho com pavor, por não saber se eles continuariam como nós, ou se nós iríamos querer que eles continuassem, mas ai nós e eles continuamos...

Morremos muitas vezes sem mostrar ao mundo nossa melhor canção, nosso melhor solo, ou nosso mais belo verso, e se sozinhos muitas vezes em pleno anonimato, e até aí nós vamos...

Essa é a diferença de quem sabe que faz algo por que gosta, por que faz bem, e por que faz certo...

Não importa o resultado e sim o propósito, e com tanta gente chamando músico de vagabundo porque ousa acordar depois das 10, mas trabalhou até as 6, e que  adora música, mas não compreende que o artista do qual é fã também é músico (embora o mundo caminhe para que isto não seja verdade)

Se você sobreviveu ao pop nacional dos anos 80, ao pagode dos anos 90, ao sertanejo e forró universitários, e agora nessa década enfrenta o batidão carioca, e mesmo assim você não desistiu, esmoreceu, ou se vendeu...Parabéns...Essa vitória é sua, e não de seus familiares, parentes e nem mesmo significa algo material, mas sim espiritual...

Arte é algo que maximiza o sofrimento, e a sensibilidade no positivo, mas o Ego pode desenfreadamente crescer no negativo...

Artista  quer aplauso, mas quer muito mais respeito...Artista Ama muito mais desenfreadamente do que odeia...Músico sofre muito mais em silêncio pessoal do que em ruidoso desabafo, pois em geral as notas e sua criatividade conseguem canalizar as lágrimas, sorrisos, e sonhos para outras almas de seu público fiel...

Em suma, esquece o lado glamoroso da coisa, esquece do Hendrix (ele morreu de overdose, e isso não é para ser louvado como bom exemplo e sim lamentado como estupidez), e se foque no seu músico favorito que é você, porque acredite, só você vai gostar de sua música e entende-la por muito tempo, já que mesmo sendo um sucesso, muita gente interpretará seu trabalho como quiser, e então acredite, você descobrirá que nem ele lhe pertence..

Sabe o que a gente leva...Nossa resiliência e Amor ao que nem palavras podem explicar...A nossa capacidade de sofrer fazendo as pessoas felizes, e depois de tudo, mesmo que num asilo, na casa de um filho, ou numa cobertura, fechamos nossos olhos um dia, e ai é que a gente descobre, que mesmo assim, a gente continua.

E aí a gente reencontra amigos para aquela conversa que não terminamos ontem, ficou pra hoje...

Por favor compartilhem esta minha homenagem e desabafo meus irmãos 

Nelson Junior

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